quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Ainda não descobri minha missão em Moçambique...

Quarenta dias se passaram desde que cheguei na África e ao chegar o mês missionário encontro na liturgia a inspiradora figura de Santa Teresa do menino Jesus. Seu caminho espiritual carregava a pergunta: “Qual minha vocação na Igreja?”. Lendo os escritos paulinos, ela se deparou com a primeira carta aos Coríntios (capítulo XII e XIII), onde percebeu que nem todos podem ser ao mesmo tempo apóstolos, profetas, doutores, etc..., que a Igreja é formada por membros diferentes e que os olhos não podem ao mesmo tempo ser as mãos.
Meus sentimentos nestes dias trazem a mesma questão. Qual minha missão em Moçambique? Das primeiras vivências permito-me levantar alguns questionamentos:
Quando visito as comunidades e me encontro com as crianças e jovens, tenho a impressão de que minha primeira missão é ser presença gratuita. Não dizer muito, simplesmente ser presença. Visitá-los, ouvi-los, ousar conhecer um pouco de sua cultura, responder suas curiosidades, entrar em suas casas e sentar-se ao chão para uma refeição.
Quando me dou conta da seriedade do itinerário catequético das comunidades. Quatro anos de iniciação cristã. Vejo a necessidade e espera pelos sacramentos do batismo, eucaristia, reconciliação e matrimônio. Os batismos chegam a dois mil em apenas um ano nas duas paróquias que atendemos. Aí percebo minha missão sacerdotal de celebrar os sacramentos e proclamar a Palavra de Deus.
Quando vejo e ouço sobre a falta de água e comida em tempo de seca, penso na missão necessária de apoiar e acompanhar os projetos de construção de poços, cisternas e dos barcos para pesca. São oito poços construídos a cada ano em nossas comunidades e como experiência piloto há duas cisternas e dois barcos de pesca em funcionamento.
Quando estou em nossa casa em Moma, vivo a experiência de descer até Nazaré e viver o cotidiano entre os visinhos do distrito de mais de quarenta mil habitantes. Aqui minha missão é mais oculta, não menos necessária. É neste espaço que permito-me refletir, ler e escrever, claro sem deixar de varrer o chão, lavar roupa e cozinhar.
Santa Teresa, na sua busca vocacional descobriu enfim sua missão: “No coração da Igreja eu serei o amor”. Penso fundamental esta iluminação. Nossas atividades pastorais precisam ter coração, não só cabeça. Os encontros se dão com pessoas e não com idéias e projetos. Aí começo intuir um pouco de minha missão. Mas confesso que nesses primeiros quarenta dias tenho a tentação de dar respostas e de resolver meus questionamentos. Aí surgem exemplos do meio do povo que pregam o evangelho sem usar palavras. Suas vidas falam do caminho do despojamento, da gratuidade e dos valores do Reino de Deus. Impressionou-me no último final de semana três crianças de nove ou dez anos que caminharam quinze quilômetros para participarem dos sacramentos em outra comunidade. Chegaram as 8h na Igreja para celebrarem a eucaristia. Depois do almoço, o Amissi José, o Gildo e a Gilda voltaram conosco porque também em sua comunidade chegara o dia prometido de visita da equipe missionária.
Nos caminhos longos que percorremos pelas estradas de chão cheias de buraco é que me vem estes sentimentos. Estes últimos quarenta dias me fizeram muito bem e talvez sejam os mais intensos do meu caminho percorrido. Tiveram gosto de um retiro prolongado e inquietante sobre minha nova missão. Deus continue me conduzindo por caminhos de abertura missionária onde o evangelizador se deixe evangelizar.

Pe.Maurício Jardim – 1 de outubro de 2008.
Missionário em Moçambique - África

Um comentário:

Unknown disse...

Grande Pe. Mauricio, só agora descobri seu Blog, e com certeza estaremos acompanhando com grande alegria seus passos na África, nunca deixe de escrever. Desde a sua ida estamos em oração, para que sua coragem e perseverança, gere muitos frutos. Mesmo que você ainda não descobriu sua missão em Moçambique, ela esta sendo cumprida para a glória de Nosso Senhor Jesus Cristo. Um grande abraço,
Silvio, Denise, Natália, Natanael e Nicolas