segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Peregrinação missionária


Terminada as celebrações natalinas onde tive a oportunidade de visitar em dez dias dez comunidades, volto para casa em preparação a uma peregrinação missionária de quinze dias, visitando quinze comunidades. Serão mais de oitenta quilômetros a pé, levando comigo o mínimo necessário, buscando aproximar-me da realidade do povo Macua.
Irão comigo três seminaristas do seminário maior da arquidiocese de Nampula: Mateus, Otávio e Agostinho. São vocações de uma das paróquias que sou pároco. O seminário os envia para férias com uma carta, solicitando acompanhamento e avaliação dos serviços realizados em um mês na paróquia.
A novidade desta peregrinação já se espalhou pela paróquia e muitos me perguntam: Padre porque ir a pé se o senhor tem carro? Tento dizer que foi uma inspiração do ano paulino. São Paulo caminhou muito a pé e não mediu esforços para comunicar a boa notícia de Jesus Cristo e seu Evangelho.
Além da motivação do ano paulino e da vontade de conhecer as comunidades, fiz este programa de visitas porque já percebi a repercussão de uma visita do padre. É uma festa quando chega a equipe missionária, porque algumas comunidades ficam um, dois ou até cinco anos sem celebrar a eucaristia. O povo se organiza e todos os ministérios da comunidade são envolvidos. São momentos fortes de evangelização, partilha, novidades, dança e celebração da eucaristia que ocupa lugar central.
O programa da peregrinação combinado com os anciãos, pastores da comunidade, é: visita as casas dos doentes, confissão, encontro com a juventude, celebração da eucaristia, escuta das preocupações e caminhada até a próxima comunidade.
Serão quinze dias “sem” muitas necessidades que tenho: energia elétrica, rede telefônica, fogão a gás, colchão para dormir, sem chuveiro, xícara de café, garfos e facas para comer. No entanto, serão dias “com”: partilha, convivência, oração, deserto, festa e realização pessoal. É muito gratificante estar no meio deste povo, embora sem condições de “fazer” ou “produzir” algo, nem responder a todas preocupações e pedidos, contudo é uma oportunidade única de estar presente de forma gratuita compartilhando a mesma fé no Cristo morto e ressuscitado. Oportunamente irei compartilhar com vocês esta experiência.
Desejo a todos que 2009 seja portador de uma vida renovada no mestre de Nazaré. Paz!



Pe.Maurício da Silva Jardim
Missionário em Moçambique

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Natal em Moçambique





Nesta noite natalina, escrevo inspirado pelo meu encontro com as pobres crianças africanas. Elas me questionam pelo seu modo de vida simples, sofrida e resistente. Não escolheram a pobreza como virtude evangélica, mas porque são de fato pobres. Desde muito cedo, aprenderam buscar água a longas distâncias, ir para roça cultivar mandioca, vender mangas ou pequenas castanhas. São despojadas no falar, no comer e no vestir. Chama atenção que apesar do sofrimento não poupam largos sorrisos. Em toda parte as vejo com olhares curiosos esperando uma palavra ou gesto que se transforma em festa.
Motivado por estas crianças escrevo com o desejo de que nossos corações, nesta noite santa, se voltem para a pobre gruta de Belém para contemplar o mistério do menino recém nascido. Nele, Deus despojou-se e desceu ao nosso encontro para nos ensinar que o caminho da felicidade autêntica e verdadeira passa pelo mistério da Encarnação. Neste dias tenho refletido que para perceber o real sentido desta noite feliz é necessário também despojar-se e descer ao encontro das pessoas, sobretudo as mais pobres e necessitadas.
Certamente, passarei um Natal diferente dos demais. Em nossa mesa não teremos as especialidades que costuma degustar. Será uma noite sem luzes, músicas e fogos de artifício. Não terei comigo os amigos(as) e familiares que amo. No entanto restará o silêncio da noite que me possibilitará ouvir o cântico dos anjos entoando: “Glória a Deus nas alturas e Paz na terra aos Homens de boa vontade”.
Sempre nas rezas peço para que toda a Igreja seja missionária no lugar onde está situada. Carrego vivo a expressão do documento de Aparecida: “É preciso sair de uma pastoral de mera conservação para uma pastoral decididamente missionária”. Nada de ficar preso as estruturas que impedem de ir ao encontro das pessoas. Sejamos livres para a missão. Para isso precisamos a cada dia viver a graça da “conversão pastoral”.
Gostaria que nesta noite pudéssemos estar celebrando juntos. Como isto não será possível, estaremos em comunhão no mesmo sentimento para escutar os pastores dizendo: “Eis que vos anuncio uma grande alegria que será para todo o povo, nasceu para nós o Salvador que é o Cristo Senhor”.


Feliz Natal!

Pe.Maurício da Silva Jardim
Missionário em Moçambique

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

A alegria que vem do sofrimento



Na vida cotidiana do povo Moçambicano há uma mistura paradoxal de alegria e sofrimento. É um povo que sofre pela falta de necessidades básicas de alimentação, água potável e atendimento na área da saúde. Caminham longas distâncias de até 50Km em busca de atendimento médico, e na maioria das vezes voltam para casa sem solução. Muitos ainda se deslocam 15Km em busca de água. As lideranças da paróquia percorrem de bicicleta mais de 20Km para uma reunião do conselho paroquial. No entanto não poupam largos sorrisos, olhares serenos e fé confiante para continuidade da missão. Alegria e sofrimento são duas realidades aparentemente contraditórias que caminham juntas e na perspectiva da fé cristã assumem dimensão de ressurreição.
Tenho me lembrado muito de São Paulo aqui neste contexto. Na perseguição, prisão e sofrimento ao invés de escrever uma carta cheia de amargura, convoca a comunidade de Filipenses a alegria: “Alegrai-vos no Senhor! Repito: alegrai-vos!”(Fl,4,4). Inspirado por este grande apóstolo farei uma peregrinação missionária a pé de 80Km, visitando e celebrando em quinze comunidades. Saio de Moma, onde resido, no dia 30 de dezembro e chego em Chalaua no dia 14 de janeiro. Comigo irão três seminaristas da filosofia e teologia de nossa paróquia. Certamente passarei um ano novo diferente dos demais, não menos feliz por acreditar que estou cumprindo uma missão que recebi de Deus.
Pastoralmente ainda estamos celebrando batismos de crianças com visitas nas comunidades. Encontrei a poucos dias uma comunidade que a seis anos não celebrava a Eucaristia, isto num universo de 140 comunidades nas duas paróquias. Na hora de fazer o programa no conselho pastoral nos vemos limitados por não conseguir atender as reais necessidades e pedidos de visita do padre as comunidades. Ficam esperando para que este dia se concretize. É muito desafiador e ao mesmo tempo realizador ser padre neste ambiente de missão. Não há espaço para perder tempo ou ocupar-se com desvios do ministério.
A volta do Pe.Fabiano ao Brasil depois de uma missão bem cumprida, faz com que pessoalmente comece um tempo de deserto e espera de outro padre gáucho para compartilhar esta missão. Sei dos esforços que os bispos e toda Igreja do Rio Grande do Sul estão fazendo para que este compromisso missionário continue além fronteiras. O povo daqui continua rezando pedindo que o Espírito Santo convoque mais missionários.
Desejo a todos(as) que neste Natal nossos corações se voltem para o mistério escondido na pobre gruta de Belém, onde Deus despojou-se e veio ao nosso encontro para nos comunicar que o caminho da felicidade autêntica e verdadeira passa pelo mistério da encarnação. Gostaria de tê-los celebrando comigo de uma forma muito simples, como isto não será possível estaremos em comunhão para ouvir, de lugares tão distantes, a voz dos pastores dizendo: “Eis que vos anuncio uma grande alegria que será para todo povo, nasceu para nós o Salvador que é o Cristo Senhor”. Muita Paz e alegria na missão que o Espírito nos confiou.



Pe.Maurício da Silva Jardim
Missionário na Igreja irmã de Moçambique